Em março de 2020 foram contabilizados 47.107.809 brasileiros beneficiários de planos privados de saúde por cobertura assistencial. 1
A Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), em reunião realizada em 08 de abril de 2020, decidiu ampliar a flexibilização de normas prudenciais, permitindo autonomia na gestão dos recursos garantidores das provisões técnicas e equalizando a exigência de capital regulatório para as operadoras que já constituíam 100% do capital exigido, para uso em ações de combate à Covid-19, em consequência, desbloquearia R$ 14,6 bilhões da reserva técnica das operadoras de planos de saúde e seguradoras.
Essas reservas técnicas são recursos das próprias operadoras que ficam bloqueados, podendo ser movimentados apenas pela ANS.
Para ter acesso ao fundo, a reguladora solicitou que as operadoras assinassem um termo afirmando garantir o atendimento aos consumidores inadimplentes com contratos individuais e familiares, coletivos por adesão e coletivos com até 29 beneficiários. A medida visa possibilitar uma renegociação para que o contratante continue obtendo acesso a saúde suplementar durante a pandemia mesmo inadimplente.
Todavia, as principais operadoras de planos de saúde do Brasil não assinaram termo de compromisso proposto pela ANS. A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que representa grande parte do setor, anunciou dia 24 de abril de 2020 a negativa, demonstrando não necessitar da liberação dos ativos, trecho do esclarecimento a seguir transcrito:
“(…) Os recursos permanecerão onde estão: provisionados (de acordo com as normas contábeis, regulatórias e melhores práticas atuariais) para caso, em algum momento futuro, seja necessário fazer frente a incertezas relacionadas, entre outros riscos, a situações econômicas adversas. Não há, portanto, que se falar em “liberação” desses ativos, já que esta não mais ocorrerá, nas condições presentes” (FenaSaúde, 2020). 2
A FenaSaúde representa as seguintes operadoras: Amil, Allianz Saúde, Bradesco Saúde, Care Plus Medicina, Gama Saúde, Golden Cross Saúde, Grupo NotreDame Intermédica, ITAUSEG Saúde, Mediservice, Metlife Odontológico, Odontoprev, Omint Saúde, Porto Seguro Saúde, Sompo Saúde, SulAmérica, Unimed Seguros Saúde.
Em contrapartida, nove operadoras assinaram e encaminharam o documento à reguladora. São elas:
Os beneficiários dessas nove operadoras podem, caso necessitem, entrar em contato com as empresas para verificar se cumprem as exigências contratuais e solicitar a renegociação de pagamento das mensalidades. Além disso, até o dia 30 de junho de 2020, os usuários dessas operadoras, nessas modalidades de plano, não poderão ser excluídos.
Mas a vedação à exclusão não decorre dos efeitos da pandemia, de acordo com a Lei n° 9656/98, o contrato de plano de saúde somente poderá ser cancelado em situações de fraude ou inadimplência do consumidor, por período superior a 60 dias, consecutivos ou não, nos últimos 12 meses de vigência do contrato e que o consumidor seja comprovadamente notificado até o 50o dia de inadimplência.
Diante desse cenário, é imperioso destacar que a ANS divulgou as principais tendências em relação à utilização de serviços de saúde hospitalares em que é possível verificar a queda dos atendimentos em pronto socorro que não geraram internação e a queda da ocupação de leitos, gráficos a seguir colacionados:
Fonte: ANS, 2020. Disponível em: <https://bit.ly/3bT4zoE>
As notícias de demissões aumentaram no Brasil também para os profissionais da saúde. A pandemia reduziu significativamente as cirurgias eletivas em todo o território nacional, significando também menos gastos das operadoras de saúde com esse tipo de serviço e o único “benefício” anunciado pelas operadoras aos consumidores, segundo a FenaSaúde, foi a suspensão dos reajustes por 90 dias:
“(…) Não obstante a não assinatura do termo, grande parte das operadoras associadas à FenaSaúde suspendeu por 90 dias, a partir de 1° de maio próximo, os reajustes das mensalidades dos planos médicos-hospitalares dos contratos individuais, coletivos por adesão e empresariais com até 29 beneficiários” (FenaSaúde, 2020). 3
Enquanto as entidades dos profissionais da saúde estão buscando linhas especiais de financiamento e negociam com operadoras de planos de saúde para se manterem ativos no mercado, verifica-se que as operadoras de planos de saúde e seguradoras, em sua maioria maciça, preferiram manter a não liberação dos ativos, não assinando termo de compromisso proposto pela ANS, mantendo os recursos provisionados para algum momento futuro, demonstrando a comodidade enfrentada pelas operadoras que mantém a rigorosidade na cobrança das mensalidades, não flexibilizando o atendimento de inadimplentes, mesmo com a diminuição substancial de seus gastos com a comprovada queda dos atendimentos em pronto socorro que não geraram internação e queda da ocupação de leitos nesse período de pandemia.
beneficiários” (FenaSaúde, 2020).
Érica Lira – OAB/DF 33.890
Luana Leocádio – OAB/DF 61.683
Walduy Fernandes de Oliveira – OAB/DF 21.529
Wendell do Carmo Sant’ana – OAB/DF 16.185
Yukary Nagatani – OAB/DF 27.613
RAUL CANAL ADVOGADOS
1 Informações retiradas do Sistema de Informações de Beneficiários-SIB/ANS/MS.
2 Disponível em: <https://bit.ly/3gc9vbC>
3 Disponível em: <https://bit.ly/3gc9vbC>.